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Sentimento Digital

Vladimir Dietrich · October 22, 2021 ·4 min read

O banco digital substitui o banco físico. Meu medo é que o filtro do Instagram substitua salões de beleza.

Medo por quê? É porque realmente passaríamos a lotear e conviver no mundo virtual.

Mas persiste a pergunta: medo por quê?

Não há por que temer. Foi apenas o medinho de mudança.

O mundo físico possui suas âncoras: a pele (o toque). Até mesmo simuladores de montanha russa conseguem simular curvas e inclinações, mas não a força da gravidade extensa. E por aí vai.

Porém o mundo do prazer é gi-gan-te. E não há poucas maneiras virtuais de dançar com este mundo.

Mas pessoas, como eu, que não são criadas desde bem cedinho em certo mundo, tendem a ter dificuldade com mudanças, como virtualizar o real.

Não que já não esteja acontecendo, e muito.

Muita complexidade do fenômeno do prazer genital vem da cultura. Em redor do “ter filhos com quem"? Pouco sei, mas por aí.

A virtualização é poderosa com exemplos como estes:

O cara passa de Ferrari na avenida principal da cidade. O motor barulhento da Ferrari "balança os genitais" do cara para as gurias que sentirem atração neste processo de chave-fechadura. Balança poder aquisitivo, principalmente, mas também certa esportividade, a cor vermelha. Mais grana mesmo.

Isto é terrivelmente virtualizável. Tanto quanto bancos se tornaram digitais.

Para que queimar combustível com escapamento que amplifica? Há maneiras digitais de atingir o ponto g, ou s de $.

E o indivíduo que busca tchutchucas pelo som alto? Aquela velha estória: DJ grátis, muito bom não poderia ser, pois não seria de graça. Plenamente virtualizável. É possível conhecer a playlist inteira do indivíduo de maneira virtual. Com fones de ouvido de alta qualidade do outro lado da linha. Não seria mais necessário usar o ar como meio de locomoção.

Mais. Quem consegue espalhar mais o som do dinheiro (escapamentão de motão cara ou Ferrari) ou o gosto musical? A internet chega até Hong Kong. O mundo físico até os passantes até 500 metros de distância, apenas.

No comentário anterior, argumento que a dança do dinheiro ou do gosto musical, no contexto de "dormir com quem", é muito mais clara no mundo virtual que no mundo real. Basta ter, ou criar, ferramentas confiáveis, e sabemos fazer isto.

Chega de estalecas, grana, dinheiro.

E físico? Barriga tanquinho? Colágeno?

Esta etapa tem algo interessante:

Antes de mais nada, só interessa esta etapa se o casal quiser se tocar de verdade. No mundo real.

Caso contrário, quem se importa?

Talvez seja importante para "material genético". Mas para isso há bancos de óvulos e sêmen, com o DNA inteiro a disposição, já já se não hoje.

Vamos então supor que seja útil de alguma maneira descobrir se o cara é fitness? Viciado em saúde? Até que ponto? Para encontrar sua chave-fechadura.

Um aplicativo é mais preciso para mostrar: correu 100km em dez minutos. Foi até a Lua em 1 minuto. 5 vezes por semana. 1 vez por mês. Tanquinho pequeno, médio ou grande. Aplicativos confiáveis podem fornecer todo o exame de sangue, rins, fígado. DNA e doenças.

Quem quer olhar alguém correndo ou ajustando o biquini fio dental circundado por colágeno? Um pouco antiquado, frente às possibilidades digitais.

Talvez até nos sintamos desnudos, pois a hipocrisia do fingir não procurar, mas olhar, é um aconchego. Mas até isso dá para virtualizar: olhar anonimamente.

Dinheiro, gosto musical, colágeno, barriga tanquinho. Digitalizáveis!

Começa a sobrar menos danças do "dormir com quem".

Bom de papo?

Preciso argumentar que papo é plenamente digitalizável?

Já acontece. As novas preliminares são algumas semanas de whatsapp. Esquentando a dança do "vou ou não vou?"

Grana, música, colágeno, músculo, papo. Digitalizáveis!

E por aí vai. A complexidade que inventamos, culturalmente, para tornar complexo um prazer inicialmente tão simples, como entre outros, o prazer com órgãos genitais, é mais digitalizável do que pensamos, porque misturamos pele com cultura.

Cultura não é pele. A complexidade do sexo é cultural.

Cultura é digital. É informação. É expectativa. Números. Desempenho. Contas. Conversa.

Por isso. É que. Quando me refiro à pele. Estou sendo literal. Só sobra a pele. Mesmo. Do arsenal cultural que inventamos. Antes de unirmos duas pessoas.

Compreendo perfeitamente a poesia de que é exatamente o fato da mulher ter algo que eu não tenho, e desejo com grande intensidade, que faz eu valorizá-la mais do que ela valoriza a ela própria, pois ela, convivendo com seios, bumbum, colágenos, bafo, curvas, suavidade, dela mesma, precisaria de mim, distante, para perceber a importância de tudo aquilo que ela possui em sua rotina. E vice-versa! ❤️